Jalapão: Deserto das águas
Dunas douradas e poços borbulhantes compõem o local ainda pouco explorado no centro do Brasil, possibilitando um mergulho em belezas naturais e em aventuras sustentáveis
A- A A+O tubérculo típico da região, o jalapa-do-brasil, inspira o nome de um dos locais mais remotos do país: Jalapão. Localizada no centro do Brasil, no Estado do Tocantins, a região abriga um paraíso natural de beleza única. Em plena mata de transição entre o cerrado e a caatinga, onde predomina uma vegetação rasteira, similar às savanas, surgem cachoeiras, rios de águas cristalinas, corredeiras, grandes chapadas e formações rochosas de cores e formas variadas.
O capim-dourado contribui para a exuberância do Jalapão e para a sustentabilidade da regiãoNesse cenário, destacam-se ainda dunas de areias douradas, com até 30 metros de altura, o que levou o lugar a ser chamado de deserto do Jalapão. Seria um deserto se o Jalapão não fosse também um paraíso das águas e um local onde a presença de flores e animais exóticos salta aos olhos.
Em 2001, tornou-se uma unidade de conservação brasileira de proteção integral à natureza: o Parque Estadual do Jalapão, com uma área de mais de 34.113 quilômetros quadrados, divididos entre os municípios de Mateiros e São Félix do Tocantins. Sua posição estratégica possui continuidade com a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins e o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba.
JALAPÃO JÁ FOI MAR
A aridez do cerrado se contrasta com a beleza das cachoeiras, dos lagos e dos fervedouros que agraciam seus visitantes e fez com que o parque ficasse conhecido como “deserto das águas”. Mas esse título, na verdade, razões pré-históricas: estudiosos afirmam que, há 350 milhões de anos, o Rio Novo, que perpassa toda a região, era um grande oceano.
A fauna regional é bastante diversificada e caracterizada por apresentar animais de pequeno, médio e grande portes
Com as mudanças climáticas e atmos féricas sofridas pelo planeta, o mar foi se afastando e deixando um rastro de riqueza biológica que a sedimentação marinha (mar), eólica (ventos), lacustre (lagos) e fluvial (rios) moldou ao longo dos milênios. Como resultado, são visíveis as montanhas de pedra que tomaram a forma de ruínas de antigas – e gigantescas – edificações.
A Serra do Gorgulho, onde grandes blocos de pedra apontam para o céu, tem um dos visuais mais pitorescos da região. A origem geológica dessa parte do Jalapão é muito remota: entre o chamado Siluriano/Devoniano e o Cretáceo, com idade entre 395 e 65 milhões de anos.
Os antigos habitantes são os índios Acroás. Extintos no século XVIII, não há muitos estudos sobre eles. A ocupação da região ocorreu posteriormente, por migrantes nordestinos e por vaqueiros que transportavam gado. No local, também houve exploração de látex das mangabeiras.
RIQUEZA DA DIVERSIDADE
A secura e as belas paisagens asseguradas por suas águas possibilitam uma harmonia única. O cerrado mostra toda a sua exuberância, com as raízes dos muricis e dos pequis, longas de propósito, enfiando-se na areia em busca da água fresca depositada em bolsões ocultos nas profundezas dos cristais de quartzo do solo. Nesses lençóis, acumula-se a água que cai farta entre outubro e março e é filtrada pelas areias finas até se formar o subsolo desse oásis dentro do cerrado, que é o Jalapão.
Nasce também da harmonia ambiental o capim-dourado, espécie de sempre-viva da família Eriocaulaceae. A palha se transforma em peças de artesanato, como pulseiras, brincos, chaveiros, bolsas, cintos, vasos, itens de decoração, dentre outras, que, da cor do ouro, brilha e ganha mercados para fora do Brasil.
Para que não entre em extinção, o capim-dourado pode ser colhido somente entre 20 de setembro e 20 de novembro. A colheita é regulamentada por lei, que proíbe a saída do material in natura da região, sendo essa permitida apenas em peças já produzidas pela comunidade local. O objetivo é promover a sustentabilidade ambiental, social e econômica da região. ACOLHIMENTO
Uma das portas de entrada do Jalapão é Novo Acordo, um vilarejo de pouco mais de 2.400 habitantes, que vive da pecuária, de alguma agricultura e de um pequeno comércio. Pelas ruas, a população, de baixa renda, anda de bicicletas, velhíssimas caminhonetes adaptadas a gás de botijão, a pé ou a cavalo.
O sol forte – a temperatura normalmente é alta, girando em torno de 30 graus – e as condições rústicas de vida não furtam o acolhimento e a simpatia do povo. A simplicidade e o carisma são diferenciais da população local, que oferece serviços como hospedagem, alimentação e orientação turística.
LUGAR REMOTO
Ao mesmo tempo, interessante pontuar que é possível passar dias no Jalapão sem ver uma única pessoa. A densidade populacional é de 0,8 hab/km². A fauna regional é bastante diversificada e caracterizada por apresentar animais de pequeno, médio e grande portes, destacando-se alguns mamíferos: onças, veados, antas, raposas, lobos-guará, tamanduás, macacos, porcos-queixada, catetus, cutias, pacas, capivaras, tatus.
Entre as aves estão arara, papagaio, periquito, ema, siriema, anu, pássaro-preto, urubu, urubu-rei, perdiz, juriti, tucano e quero-quero.
Cobras, camaleões, sapos, pererecas e rãs são representantes dos répteis e dos anfíbios, e os principais peixes da região são piabinha, caranha, jaú, mandin, pacu, traíra, piau, piaba, surubim e barbado.
ECOTURISMO
A sintonia entre a fauna, a flora e a população local oferece um ambiente propício para o ecoturismo. Aos praticantes do rafting – descida em rios utilizando-se botes –, as corredeiras do Rio Novo propiciam aventura até para quem não sabe nadar, pois são ora turbulentas, ora tranquilas. Há duas opções. Uma são os longos percursos, de até quatro dias, em que é possível conhecer cachoeiras de alto nível de dificuldades e fazer paradas nas pequenas praias de areia branca e fina que se formam nas margens do rio. Outra opção, mais rápida, escolhida pela maioria dos turistas, dura três horas de descida (seis quilômetros).
A melhor época para praticar o rafting é de maio a setembro, período de seca no Tocantins, quando as estradas de acesso ao Jalapão estão em melhores condições de tráfego.
ABUNDÂNCIA HÍDRICA
Alimentada pelo Rio Novo, a Cachoeira da Velha é a maior do Jalapão e uma de suas principais atrações. Nela, as águas correm em grande quantidade, despencando por duas quedas em formato de ferradura, cada uma com mais de 20 metros de largura.
Após se deslumbrar com a exuberância da Cachoeira da Velha, uma boa pedida é percorrer uma trilha, de aproximadamente uma hora, até a Prainha, um lugar bastante agradável, com sombra e águas doces e mansas, cercado por matas de galeria. Alguns dos visitantes do Jalapão encontram na Prainha o local ideal para acampar, onde podem passar momentos mais duradouros em contato com a natureza. Outros se contentam em banhar-se em suas águas, apreciando a beleza do cenário.
Já a Cachoeira do Formiga é uma pequena queda d`água, cercada por uma vegetação exuberante, de árvores altas, samambaias e moitas de palmeiras nativas. Mas o espetáculo mesmo fica por conta da piscina formada ao pé da cachoeira, onde águas de um verde-esmeralda encantador convidam para o mergulho.
Além disso, surge em meio à vegetação fechada, entre brejos e riachos, um lugar de rara beleza, rodeado por bananeiras. No centro do Fervedeuro, está um grande poço de água azul transparente, que é a nascente de um rio subterrâneo. A água que brota das areias claras cria o fenômeno da ressurgência, que torna impossível até o banhista mais persistente afundar.
DUNAS
Outro cenário um tanto inesquecível é repleto por enormes dunas de areia dourada (areia de quartzo), de até 30 metros de altura. Elas estão em constante movimento, guiadas pelos ventos. Ao seu redor, está a Serra do Espírito Santo, de formação arenosa, cuja erosão é causada pela ação dos ventos., originando as dunas. Essa serra é o cartão-postal da região, que abriga um mirante, de cujo cume, após uma hora de caminhada, é possível ter uma visão privilegiada de toda a região. O topo da serra é uma grande área plana, que lembra uma imensa mesa elevada. É o local ideal para apreciar as paisagens e os horizontes do Jalapão.
PARA AMANTES DA NATUREZA
O Jalapão é, ao mesmo tempo, acolhedor e hostil. Deve se embrenhar nesse território somente quem é amante da natureza pura e primitiva, quem gosta de aventura e tem, no mínimo, dez dias disponíveis, de preferência entre os meses de abril e setembro.
Para a visita, é obrigatório estar em um veículo com tração nas quatro rodas e carregar combustível, pois quase não há postos nas estradas. Mapas, protetor solar, cantil, barraca, mantimentos e remédios completam a tralha imprescindível.
COMO CHEGAR
O ponto de partida é Palmas, a 180 quilômetros de Jalapão. Dessa capital, seguem-se 64 quilômetros, pela rodovia TO-050, até Porto Nacional, e, depois, 116 quilômetros, pela TO-255, até Ponte Alta do Tocantins, considerada a entrada do Jalapão. Outra opção de acesso ao local é sair de Palmas pela TO-020, sentido Norte (108 km de extensão), com entrada para Novo Acordo. Também se pode trafegar pela TO- 030 (100 km de extensão), interligação com Taquaruçu e Santa Tereza do Tocantins.
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