Jalapão: Deserto das águas

Dunas douradas e poços borbulhantes compõem o local ainda pouco explorado no centro do Brasil, possibilitando um mergulho em belezas naturais e em aventuras sustentáveis

Capa / 05 de Março de 2015 / 0 Comentários
A- A A+

O tubérculo típico da região, o jalapa­-do-brasil, inspira o nome de um dos locais mais remotos do país: Jalapão. Localizada no centro do Brasil, no Estado do Tocantins, a região abriga um paraíso natural de beleza única. Em plena mata de transição entre o cerrado e a caatinga, onde predomina uma vegetação rasteira, similar às savanas, surgem cachoeiras, rios de águas cristalinas, corredeiras, grandes chapadas e formações rochosas de cores e formas variadas.

O capim-dourado contribui para a exuberância do Jalapão e para a sustentabilidade da regiãoNesse cenário, destacam-se ainda dunas de areias douradas, com até 30 metros de al­tura, o que levou o lugar a ser chamado de deserto do Jalapão. Seria um deserto se o Jala­pão não fosse também um paraíso das águas e um local onde a presença de flores e animais exóticos salta aos olhos.

Em 2001, tornou-se uma unidade de conservação brasileira de proteção integral à natureza: o Parque Estadual do Jalapão, com uma área de mais de 34.113 quilômetros quadrados, divididos entre os municípios de Mateiros e São Félix do Tocantins. Sua posição estratégica possui continuidade com a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins e o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba.

JALAPÃO JÁ FOI MAR

A aridez do cerrado se contrasta com a beleza das cachoeiras, dos lagos e dos ferve­douros que agraciam seus visitantes e fez com que o parque ficasse conhecido como “deserto das águas”. Mas esse título, na verdade, ra­zões pré-históricas: estudiosos afirmam que, há 350 milhões de anos, o Rio Novo, que per­passa toda a região, era um grande oceano.

A fauna regional é bastante diversificada e caracterizada por apresentar animais de pequeno, médio e grande portes

Com as mudanças climáticas e atmos­ féricas sofridas pelo planeta, o mar foi se afastando e deixando um rastro de riqueza biológica que a sedimentação marinha (mar), eólica (ventos), lacustre (lagos) e fluvial (rios) moldou ao longo dos milênios. Como resultado, são visíveis as montanhas de pedra que tomaram a forma de ruínas de antigas – e gigantes­cas – edificações.

A Serra do Gorgulho, onde grandes blocos de pedra apontam para o céu, tem um dos visuais mais pitorescos da região. A origem geológica dessa parte do Jalapão é muito remota: entre o chamado Siluriano/Devoniano e o Cretáceo, com idade entre 395 e 65 milhões de anos.

Os antigos habitantes são os índios Acroás. Extintos no século XVIII, não há muitos estudos sobre eles. A ocupação da região ocorreu posteriormente, por migran­tes nordestinos e por vaqueiros que trans­portavam gado. No local, também houve exploração de látex das mangabeiras.

RIQUEZA DA DIVERSIDADE

A secura e as belas paisagens assegu­radas por suas águas possibilitam uma har­monia única. O cerrado mostra toda a sua exuberância, com as raízes dos muricis e dos pequis, longas de propósito, enfiando­-se na areia em busca da água fresca depo­sitada em bolsões ocultos nas profundezas dos cristais de quartzo do solo. Nesses len­çóis, acumula-se a água que cai farta entre outubro e março e é filtrada pelas areias finas até se formar o subsolo desse oásis dentro do cerrado, que é o Jalapão.


Nasce também da harmonia ambien­tal o capim-dourado, espécie de sempre­-viva da família Eriocaulaceae. A palha se transforma em peças de artesanato, como pulseiras, brincos, chaveiros, bolsas, cintos, vasos, itens de decoração, dentre outras, que, da cor do ouro, brilha e ganha merca­dos para fora do Brasil.

Para que não entre em extinção, o capim-dourado pode ser colhido somente entre 20 de setembro e 20 de novembro. A colheita é regulamentada por lei, que proí­be a saída do material in natura da região, sendo essa permitida apenas em peças já produzidas pela comunidade local. O obje­tivo é promover a sustentabilidade ambien­tal, social e econômica da região. ACOLHIMENTO

Uma das portas de entrada do Jalapão é Novo Acordo, um vilarejo de pouco mais de 2.400 habitantes, que vive da pecuária, de alguma agricultura e de um pequeno comércio. Pelas ruas, a população, de baixa renda, anda de bicicletas, velhíssimas cami­nhonetes adaptadas a gás de botijão, a pé ou a cavalo.


O sol forte – a temperatura normal­mente é alta, girando em torno de 30 graus – e as condições rústicas de vida não furtam o acolhimento e a simpatia do povo. A simplicidade e o carisma são dife­renciais da população local, que oferece serviços como hospedagem, alimentação e orientação turística.

LUGAR REMOTO

Ao mesmo tempo, interessante pontuar que é possível passar dias no Jalapão sem ver uma única pessoa. A densidade popula­cional é de 0,8 hab/km². A fauna regional é bastante diversifica­da e caracterizada por apresentar animais de pequeno, médio e grande portes, desta­cando-se alguns mamíferos: onças, veados, antas, raposas, lobos-guará, tamanduás, macacos, porcos-queixada, catetus, cutias, pacas, capivaras, tatus.

Entre as aves estão arara, papagaio, periquito, ema, siriema, anu, pássaro-preto, urubu, urubu-rei, perdiz, juriti, tucano e quero-quero.

Cobras, camaleões, sapos, pererecas e rãs são representantes dos répteis e dos anfíbios, e os principais peixes da região são piabinha, caranha, jaú, mandin, pacu, traíra, piau, piaba, surubim e barbado.


ECOTURISMO

A sintonia entre a fauna, a flora e a população local oferece um ambiente pro­pício para o ecoturismo. Aos praticantes do rafting – descida em rios utilizando-se botes –, as corredeiras do Rio Novo pro­piciam aventura até para quem não sabe nadar, pois são ora turbulentas, ora tran­quilas. Há duas opções. Uma são os longos percursos, de até quatro dias, em que é possível conhecer cachoeiras de alto nível de dificuldades e fazer paradas nas peque­nas praias de areia branca e fina que se formam nas margens do rio. Outra opção, mais rápida, escolhida pela maioria dos turistas, dura três horas de descida (seis quilômetros).

A melhor época para praticar o rafting é de maio a setembro, período de seca no Tocantins, quando as estradas de acesso ao Jalapão estão em melhores condições de tráfego.

ABUNDÂNCIA HÍDRICA

Alimentada pelo Rio Novo, a Ca­choeira da Velha é a maior do Jalapão e uma de suas principais atrações. Nela, as águas correm em grande quantidade, des­pencando por duas quedas em formato de ferradura, cada uma com mais de 20 metros de largura.

Após se deslumbrar com a exuberância da Cachoeira da Velha, uma boa pedida é percorrer uma trilha, de aproximadamente uma hora, até a Prainha, um lugar bastan­te agradável, com sombra e águas doces e mansas, cercado por matas de galeria. Alguns dos visitantes do Jalapão encon­tram na Prainha o local ideal para acampar, onde podem passar momentos mais dura­douros em contato com a natureza. Outros se contentam em banhar-se em suas águas, apreciando a beleza do cenário.


Já a Cachoeira do Formiga é uma pe­quena queda d`água, cercada por uma vege­tação exuberante, de árvores altas, samam­baias e moitas de palmeiras nativas. Mas o espetáculo mesmo fica por conta da piscina formada ao pé da cachoeira, onde águas de um verde-esmeralda encantador convidam para o mergulho.

Além disso, surge em meio à vegetação fechada, entre brejos e riachos, um lugar de rara beleza, rodeado por bananeiras. No centro do Fervedeuro, está um grande poço de água azul transparente, que é a nascen­te de um rio subterrâneo. A água que brota das areias claras cria o fenômeno da ressur­gência, que torna impossível até o banhista mais persistente afundar.

DUNAS

Outro cenário um tanto inesquecível é repleto por enormes dunas de areia doura­da (areia de quartzo), de até 30 metros de altura. Elas estão em constante movimento, guiadas pelos ventos. Ao seu redor, está a Serra do Espírito Santo, de formação areno­sa, cuja erosão é causada pela ação dos ven­tos., originando as dunas. Essa serra é o car­tão-postal da região, que abriga um mirante, de cujo cume, após uma hora de caminhada, é possível ter uma visão privilegiada de toda a região. O topo da serra é uma grande área plana, que lembra uma imensa mesa eleva­da. É o local ideal para apreciar as paisagens e os horizontes do Jalapão.


PARA AMANTES DA NATUREZA

O Jalapão é, ao mesmo tempo, acolhe­dor e hostil. Deve se embrenhar nesse terri­tório somente quem é amante da natureza pura e primitiva, quem gosta de aventura e tem, no mínimo, dez dias disponíveis, de pre­ferência entre os meses de abril e setembro.

Para a visita, é obrigatório estar em um veículo com tração nas quatro rodas e carregar combustível, pois quase não há postos nas estradas. Mapas, protetor solar, cantil, barraca, mantimentos e remédios completam a tralha imprescindível.

COMO CHEGAR
O ponto de partida é Palmas, a 180 quilômetros de Jalapão. Dessa capital, seguem-se 64 quilômetros, pela rodovia TO-050, até Porto Nacional, e, depois, 116 quilômetros, pela TO-255, até Ponte Alta do Tocantins, considerada a entrada do Jalapão. Outra opção de acesso ao local é sair de Palmas pela TO-020, sentido Norte (108 km de extensão), com entrada para Novo Acordo. Também se pode trafegar pela TO- 030 (100 km de extensão), interligação com Taquaruçu e Santa Tereza do Tocantins.

AVISO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião de Revista Entrevias. É vedada a inserção de comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros. Revista Entrevias poderá retirar, sem prévia notificação, comentários postados que não respeitem os critérios impostos neste aviso ou que estejam fora do tema da matéria comentada.