Dois pesos, duas medidas
Preço do óleo diesel dispara, e governo reduz imposto, mas reajuste na tabela do frete não acompanha. Para suprirem o rombo, autônomos recebem vale até dezembro.
A- A A+Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mostram que, em um ano, o preço médio do litro do óleo diesel nas bombas subiu aproximadamente 60%. No mesmo período, o piso do frete foi reajustado em menos de 30%, segundo dados publicados na CNN.
A disparada forçou o governo a tomar medidas urgentes mesmo perto das eleições e a aprovar o auxílio de R$ 1.000 para caminhoneiros autônomos.
Em meados de julho, a Câmara e o Senado aprovaram a Lei Complementar 194/2022, que limitou a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para gasolina e etanol à alíquota mínima de cada Estado. Rapidamente, a medida impactou o preço principalmente da gasolina.
Esse desequilíbrio afeta diretamente os transportadores e causa impactos nos custos do transporte. Diante desse cenário, a Confederação Nacional do Transporte (CNT) defendeu a recomposição imediata do preço do frete. “O transporte rodoviário de cargas é um serviço essencial e se mostrou imprescindível durante a pandemia. Contudo, é inviável que as empresas continuem absorvendo as altas dos preços do combustível”, afirmou a instituição.
A confederação ressaltou que a recomposição da tabela é fundamental para se evitar o colapso de inúmeras empresas transportadoras que, antes mesmo dos últimos reajustes, já vinham negociando com os clientes o repasse de quase 50% do aumento do diesel registrado no ano passado. A CNT alertou que, sem o repasse imediato, a operação de transporte no Brasil corre o risco de se tornar inviável.
“É claro que nos preocupamos com a população e com as consequências que o repasse desse aumento trará à vida das pessoas. Estamos atentos e muito preocupados com toda essa situação, mas o setor, infelizmente, não tem mais quaisquer condições de segurar esse aumento, que deve ser repassado imediatamente”, afirmou o presidente da confederação, Vander Costa, ainda no início deste ano.
Auxílio
O Ministério do Trabalho e Previdência já divulgou o calendário para o pagamento do auxílio a caminhoneiros e taxistas afetados pela alta do preço dos combustíveis. Ele será pago de agosto a dezembro deste ano, sendo que a de agosto será em dobro porque se refere também ao mês de julho.
O valor aprovado é de R$ 1.000, e a primeira parcela será de R$ 2.000. O objetivo é cobrir o efeito da alta do diesel. O auxílio-caminhoneiro começa a ser pago no dia 9 de agosto, e as próximas parcelas estão agendadas para 24 de setembro, 22 de outubro, 26 de novembro e 17 de dezembro.
O benefício emergencial aos transportadores autônomos de carga será pago a todos os caminhoneiros autônomos cadastrados no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC) até 31 de maio deste ano. O cadastro precisa estar ativo, assim como o CPF e a Carteira Nacional de Habilitação do beneficiado. O valor é fixo independentemente da quantidade de veículos que o motorista possuir.
Para Irani Gomes, presidente do Sindicato das Empresas Transportadoras de Combustível e Derivados de Petróleo do Estado de Minas Gerais (SindTanque-MG), toda ajuda é bem-vinda, mas, com o valor atual do diesel, o valor pago não é tão significativo para amenizar os impactos financeiros que os caminhoneiros têm no momento. “Hoje, R$ 1.000 dão para colocar 130 litros, que o caminhão gasta em um percurso de 250 km. Isso é insignificativo diante do que gasta um caminhão no transporte de carga. É pouco para amenizar qualquer impacto que o caminhoneiro está tendo por causa dos aumentos recorrentes do preço do óleo diesel”, afirmou.
Para ele, a solução é reduzir o ICMS do óleo diesel, e não só da gasolina e do etanol, como foi feito. “O diesel, sim, impacta a inflação e toda a economia. Oitenta por cento das cargas no país circulam pelo transporte rodoviário. Então, o preço do diesel impacta tudo. A pergunta que fazemos é: ‘por que as alíquotas sobre o óleo diesel não foram reduzidas também?’”, completou Irani.
Tabela do frete
No fim de julho, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) aprovou o reajuste da tabela dos pisos mínimos de frete do transporte rodoviário de cargas. O aumento tem como base o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado no período de dezembro de 2021 a junho de 2022.
De acordo com a ANTT, também será aplicada a variação do valor do óleo diesel S10, referente aos valores divulgados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para o período de 10 a 16 de julho.
A revisão feita agora não altera a metodologia vigente, segundo a ANTT, apenas aplica a variação acumulada do IPCA sobre itens de custo, compostos pelos insumos e serviços relacionados à prestação do serviço, além de atualizar o valor do diesel.
“O óleo diesel representa muito dos gastos dos caminhoneiros e é apenas um dos itens, ou seja, ainda precisamos sempre ficar de olho em pneu, manutenção do veículo e outros. É fundamental que o governo adote medidas para reduzir o preço do diesel e esteja sempre buscando o menor preço porque o impacto disso em toda a cadeia produtiva é grande”, declarou o presidente do Sindicato dos Cegonheiros de Minas Gerais (Sintrauto), Carlos Roesel.
Estoque
Um dos gargalos com relação ao preço do diesel é que o Brasil está cada vez mais dependente de importações, e essa conta fica mais cara quando o S10 se torna mais caro no mercado internacional.
A Rússia é responsável por abastecer 15% do mercado mundial de diesel, ou seja, a guerra com a Ucrânia impacta diretamente o fornecimento e o preço. Isso tem forçado o Brasil a estocar o diesel para reduzir a necessidade de importação imediata pra suprir o mercado interno.
Em meados de julho, o ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, disse que o Brasil conseguiu manter diesel em estoque para 50 dias sem necessidade de importação. Até a data, a soma chegava a 1,6 milhão de metros cúbicos do diesel S10, que não tem adição do biodiesel. “Se acontecer alguma coisa no mundo e não se puder importar mais petróleo, o Brasil terá 50 dias de diesel sem precisar importar”, declarou o ministro.
Segundo ele, a pasta monitora o cenário de abastecimento no mercado internacional junto com a ANP. Hoje, as empresas do setor são obrigadas a manter um estoque do diesel de três a cinco dias para atender ao mercado.
Diante desse cenário, a indústria do biodiesel pressiona o governo para que aumente os percentuais da mistura de biocombustível no diesel fóssil. O percentual hoje está fixado em 10% desde o ano passado, e a proposta é que aumente para 14% pra reduzir a crise no abastecimento. O problema é que o percentual também aumentaria ainda mais o preço do combustível. (Com as agências Brasil e CNT Transporte Atual)
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