Realidade ainda muito distante
O Anel Rodoviário de Belo Horizonte é palco constante de acidentes, mortes e abandono. Implementadas em várias rodovias do país, as áreas de escape são a solução para evitar tantas tragédias.
A- A A+O uso de áreas de escape nas rodovias brasileiras tem salvado vidas em todo o país. Em Minas Gerais, no entanto, um dos trechos campeões de ocorrências, o Anel Rodoviário de Belo Horizonte, ainda não foi contemplado com a solução. Caso contrário, várias ocorrências teriam sido evitadas ao longo dos 27 km da via.
Atualmente, 17 km são administrados pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Os outros 10 km foram concedidos à Via 040. Em média, 160 mil veículos circulam por lá todos os dias.
Um balanço recente da Polícia Militar Rodoviária mostra que, somente nos meses de março e abril deste ano, foram registrados 390 acidentes na rodovia, além de nove atropelamentos. No último mês de agosto, uma carreta perdeu os freios e bateu em outra carreta e em um caminhão, arrastando 17 veículos na altura do bairro Betânia, no KM 537. Felizmente, não houve vítimas. Episódios como esse são comuns no local, e vários deles resultam em mortes. Para os motoristas de veículos pesados, que muitas vezes enfrentam o desafio de frear rapidamente – especialmente nos trechos de descida –, a criação de áreas de escape seria a solução ideal para evitar desastres.
“Diante de tantas tragédias que vêm acontecendo no Anel Rodoviário de Belo Horizonte e das soluções apresentadas – inclusive modelos já em uso no Brasil, como as áreas de escape –, não vejo como não responsabilizar aqueles que deveriam cumprir o seu papel na solução dos problemas relacionados às vias terrestres. Isso cabe tanto à concessionária que administra o trecho quanto aos órgãos públicos que deveriam fiscalizá-lo”, afirma o presidente do Sindicato das Associações de Auxílio Mútuo dos Transportadores de Carga e de Pessoas do Estado de Minas Gerais (SindMútuo-MG), Geraldo Eugênio de Assis.
Ele também critica o despreparo daqueles que deveriam zelar pela segurança dos usuários da via. “Começamos a descida do Anel Rodoviário com uma placa de [limite de] 70 km/h. Um caminhão pesado, que vem de outra rodovia, ao entrar na descida nessa velocidade, pode se complicar, perder os freios e causar acidentes. Colocam pessoas sem qualquer experiência para administrar e controlar um trecho de alta periculosidade. O resultado não poderia ser outro: mortes atrás de mortes”, complementa Assis.
Em nota, o Dnit informou que existe uma licitação em fase final para a contratação da empresa que fará a elaboração de estudos e do projeto de reforma do Anel Rodoviário no trecho entre os KMs 456 e 467,4, responsáveis por definir, segundo o departamento, a melhor solução para a rodovia.
Já a Via 040 informou que a sua responsabilidade contratual são a prestação de serviços ao usuário, a manutenção e a conservação da pista. No processo de concessão, conforme informado pela empresa, não estavam previstos a ampliação da capacidade nem outros tipos de melhorias pela concessionária que assumisse a gestão do trecho.
NA PRÁTICA
As áreas de escape já são uma realidade nas rodovias brasileiras. Em 2019, o Dnit entregou uma obra até então inédita para o órgão em um trecho com declive sinuoso na BR-146, próximo a Araxá, no Alto Paranaíba. Em uma situação de emergência, os motoristas de veículos de carga podem desviar a rota rapidamente e entrar no recuo especial.
Uma matéria publicada recentemente pelo Portal Estradas mostra que as concessionárias de rodovias também já estão investindo nessa estratégia. Os exemplos citados foram os da Arteris e da EcoRodovias. A publicação informa que somente nas BRs 116 e 376, de 2011 a 2020, foram registradas 287 situações de emergência nas quais as áreas foram usadas para evitar acidentes envolvendo caminhões e ônibus.
A pioneira no uso dessa funcionalidade, segundo a matéria, foi a Ecovias dos Imigrantes, do grupo EcoRodovias, responsável pelo Sistema Anchieta-Imigrantes. A pista paralela específica para situações de emergência foi construída em 2001, na altura de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. Desde então, novas áreas vêm sendo criadas na rodovia.
Já o Grupo Arteris investiu aproximadamente R$ 37 milhões nos últimos anos para construir áreas de escape, principalmente nos trechos de serra com muitos registros de acidentes com caminhões.
No caso do Anel Rodoviário, a Comissão Parlamentar Especial de Estudo sobre a via sugeriu, em 2018, a construção desses recuos no trecho que liga a BR-040 à BR-381. O recurso, segundo a comissão, foi apresentado à Via 040 para ser implementado especialmente na descida entre os bairros Olhos D’água e Betânia, onde se concentram as ocorrências com veículos pesados.
ENREDO COMPLEXO
O Anel Rodoviário de Belo Horizonte tem uma série de imbróglios para serem resolvidos. Em 2017, a prefeitura da capital mineira apresentou uma ação civil pública pedindo a transferência da gestão da rodovia para o município. Em tese, hoje, caso o Executivo belo-horizontino queira realizar uma obra na via, ele não tem competência para isso. A ação foi movida contra a Agência Nacional de Transportes Terrestres, o Dnit e a Via 040, já que os acidentes mais graves acontecem no trecho concedido.
Para gerir essa extensão, o governo municipal pede a transferência de recursos da União. Há três anos, o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), chegou a dizer que o Anel Rodoviário estava “abandonado”. Entre 2007 e 2016, 319 pessoas morreram em acidentes na rodovia, e mais de 10 mil ficaram feridas.
Enquanto isso, o governo federal tenta a desocupação de trechos para que seja feita a concessão dos 27 km da via e dos 303 km da BR-381 à iniciativa privada. O lote é um dos campeões em acidentes no Estado.
Recentemente, um acordo foi celebrado pela Advocacia-Geral da União para garantir novas moradias às cerca de 700 famílias que precisarão ser despejadas. Ficou acertado que o reassentamento será de responsabilidade da futura concessionária.
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