O Brasil, nos últimos meses, se uniu para um propósito comum: ajudar o Rio Grande do Sul. No dia 27 de abril, chegou à capital gaúcha uma frente fria ocasionando chuvas e ventos sem igual e, com ela, milhares de pessoas desabrigadas, mortes e cidades devastadas. A maior catástrofe climática registrada no Brasil despertou uma das maiores mobilizações nacionais. As brasileiras e os brasileiros se uniram para que o povo gaúcho recebesse itens básicos - como alimentos, água, material de higiene pessoal e roupas com muita empatia e esperança.
Há ainda aqueles que atuaram no front. Os Anjos do Asfalto seguiram para o Rio Grande do Sul e ajudaram nos salvamentos de moradores e animais, além de realizarem uma grande campanha para arrecadar recursos, principalmente para a compra de água, que foi entregue nos principais locais impactados pelas enchentes.
Concebida, organizada e liderada pelo presidente dos Anjos do Asfalto e da Prevenir Proteção Veicular, Geraldo Eugênio de Assis, a estratégia de salvamento e de doações contou com a larga experiência desse especialista em situações de risco, como o rompimento de barragens e deslizamentos, e com sua incansável vontade de colaboração. “Diante do agravamento da situação no Rio Grande do Sul, partimos para essa região com propósitos definidos: atuar no salvamento e na arrecadação de itens essenciais. Pra dar visibilidade ao nosso trabalho, o Instagram @anjosdoasfaltomg.oficial foi o ambiente que usamos para atualizar sobre os acontecimentos e para prestar contas da entrega das doações”, explicou Geraldo.
O primeiro vídeo gravado por Geraldo de Assis alertando sobre o problema e solicitando doações viralizou no Instagram e no Whatsapp no dia 2 de maio. Naquele momento, o Brasil começava a tomar conhecimento das dimensões da tragédia e as mobilizações se iniciavam, formando, assim, uma rede de solidariedade, que contou com a participação de colegas transportadores, empresários, organizações não governamentais e sociedade civil.
Uma dessas publicações levou Mariana Cristina de Oliveira Palhares a mobilizar comerciantes e moradores de Igarapé para doar. Ela, que já faz uma campanha no Natal todos os anos pra doar brinquedos a crianças de comunidades de baixa renda da cidade, entrou rapidamente em contato com Geraldo para saber se tinha lugar para mais doações no caminhão que iria para o Rio Grande do Sul. “Na primeira ida, conseguimos arrecadar água, mantimentos e fraldas principalmente. Ainda estamos recolhendo; empresários e moradores da cidade ajudaram muito”, contou Mariana.
Transporte solidário
Geraldo se envolveu na mobilização de parceiros para arrecadação, e o resultado foi a entrega de 1.500 cestas básicas, 20 mil litros de água e centenas de materiais para higiene pessoal, roupas e diversos itens de necessidade básica. “Descarregamos todas as doações em galpões nas cidades de Canoas, Igrejinha, Taquara e Nova Hamburgo”, relembrou o presidente dos Anjos do Asfalto.
O transporte dos itens contou com a ajuda fundamental de Rodolfo Pereira do Amaral, sócio-proprietário e diretor geral da Giro Locações e Serviços LTDA., que disponibilizou uma carreta de grande porte para colaborar com a entrega das doações. “Inicialmente, pensei que o caminhão era enorme e fiquei com medo de nem conseguir encher, mas o resultado foi maravilhoso graças à mobilização e à ajuda de amigos que confiaram em nosso trabalho. Colocamos um ponto de coleta na empresa e, durante uma semana, deixei o serviço para atender as arrecadações, que não paravam de chegar. Tinha dia que chegavam mais de 20 caminhonetes”, informou Rodolfo.
O Sindicato dos Cegonheiros de Minas Gerais (Sintrauto/MG) demonstrou mais uma vez seu compromisso com a solidariedade ao contribuir significativamente para uma campanha de cestas básicas. “Nosso setor é marcado pela colaboração e generosidade, e não poderíamos deixar de participar nesse momento tão difícil para os gaúchos. As iniciativas dos Anjos do Asfalto têm nossa total confiança. Estamos engajados com o coração aberto e com sinceros votos de um futuro melhor para o povo do Rio Grande do Sul”, declarou Carlos Roesel, presidente do Sintrauto/MG.
Márcio Arantes, presidente da Associação Particular de Ajuda ao Colega (Apac) Sul, contou que a entidade doou 100 cestas básicas e emprestou duas carretas para o transporte das doações até a região Sul do país. Segundo ele, a rede solidária foi grande. “Além do que a gente conseguiu, outros amigos nossos nos ajudaram com combustível, pedágio e vários itens necessários para levar a carga e trazer o caminhão. Graças a Deus, temos uma turma muito boa e unida no setor. Temos que agradecer porque o Geraldo tem uma habilidade grande para mobilizar, sabe como fazer, e nós estamos aqui prontos para ajudar. Tenho certeza de que nossos irmãos do Rio Grande do Sul vão se levantar”, afirmou Márcio.
O presidente da Cooperativa dos Transportadores de Automóveis e de Consumo do Estado de Minas Gerais (Coopercemg), José Geraldo de Faria, o Zé da Padaria, lembrou outras tragédias em que o setor se mobilizou rapidamente para ajudar. Nos deslizamentos de Petrópolis, no rompimento da barragem em Brumadinho, nas enchentes no Rio Grande do Sul do ano passado e, agora, novamente e de maiores proporções. “Fico muito feliz com essa participação de todos, inclusive levo para os cooperados essas ações, e todos concordam que devemos ajudar sim. Conseguimos ajudar muitas pessoas que estão precisando”, destacou.
A Associação de Fomento e Cooperativismo ao Transporte de Cargas do Brasil (Afocoop) também participou por meio da doação de cem cestas básicas. “Toda vez que o Geraldo precisa de alguma coisa, a gente ajuda. Para o Rio Grande do Sul não foi diferente. Uma das nossas funções é colaborar. Só fizemos o que temos obrigação de fazer”, afirmou Rogério Batista do Carmo, presidente da Afocoop. Essa instituição fica em Betim, e as cestas foram compradas prontas junto a outra remessa que a associação já adquire para outras doações.
Outro parceiro da campanha foi a Autoport. “Desde o início, a empresa se mostrou solidária a essa tragédia. Assistimos nossos funcionários, encaminhamos diversas doações e, quando solicitados pelo Geraldo, disponibilizamos um caminhão com motorista para levar as doações. Lamentamos por todos que foram vítimas nessa tragédia. A solidariedade faz parte da política de nossa empresa”, enfatizou o gerente de operações da Autoport, Osmário Pereira.
Quem também doou mais 100 cestas básicas foram as empresas Amec Transportes e Conluck Contabilidade. Glayson Sobrinho Pacheco, sócio-diretor da Conluck, disse que foi uma felicidade poder ajudar nessa ação. “Esperamos que esse gesto incentive mais pessoas a doarem, até porque ainda tem muito trabalho e ajuda a serem enviados, visto que as famílias perderam tudo. Toda a situação que está acontecendo no Sul nos comoveu muito. E, por trabalharmos com transporte, nos mobilizamos para ajudar o próximo. A ação foi entre as empresas Amec Transportes e Conluck Contabilidade, onde os funcionários fizeram as doações das cestas básicas. O pouco com Deus é muito”, disse Glayson.
Rede do bem
“Quando vi a devastação que atingiu os moradores do Sul, soube que não podia ficar parado. Pelas redes sociais, acompanhei a mobilização que estava sendo promovida pelo Geraldo e, na mesma, hora resolvi ajudá-lo de alguma forma”, contou Vinícius Faria, da empresa FriologBrasil. Ele disponibilizou um caminhão para levar as doações até o Rio Grande do Sul. “Várias pessoas ajudaram nessa arrecadação de valores e movimentação para que fosse possível, de forma rápida, enviar os itens ao Sul na tentativa de minimizar um pouco a dor e o sofrimento do que estavam ali, naquele, momento precisando muito. Juntos, somos mais fortes e, por meio do amor ao próximo, podemos começar a reconstruir o que foi perdido”, completou Vinícius.
O Rotary, organização internacional dedicada a causas humanitárias, mobilizou rapidamente sua rede na Região Metropolitana de Belo Horizonte para arrecadar doações. Geraldo Eugênio de Assis, que foi presidente do Rotary Contagem, divulgou a campanha entre os rotarianos e recebeu muitos retornos positivos.
Paulo Ramiz Lasmar, presidente do Rotary Clube BH Oeste, foi um deles. Ele, que também foi presidente do América Futebol Clube, disparou para toda a sua rede para arrecadar as doações necessárias. “Contamos com a parceria da Transrefer, a TRF Transportadora, do Raimundo e da Graça, casal que é do Rotary também. Eles cederam as carretas para fazer o transporte das doações até o Sul, que foi fundamental. Nossa ideia inicial era enviar uma carreta com 30 toneladas, mas conseguimos encher duas carretas com um total de 50 toneladas de donativos”, contou Lasmar. Segundo ele, foram enviados água, roupa, material de limpeza, pás e inchadas para a limpeza, carrinho de mão, alimentos e até um barco com motor. “Foi uma resposta incrível da sociedade ao nosso chamado para ajudar!”, completou.
O ponto de coleta, contou Paulo Lasmar, foi o Estádio Independência. “O estádio ficou aberto para as doações durante uma semana. Depois, as carretas seguiram para Caxias do Sul, onde foram recebidas por rotarianos de lá. Conseguimos controlar o processo de ponta a ponta, desde a arrecadação, o transporte e a distribuição. Até hoje temos recebido doações e estamos juntando para mobilizar outra carreta quando tiver uma quantidade suficiente”, afirmou.
A empresária Kênia Regiane de Rezende também fez uma grande mobilização pelas pessoas e pelos animais. Até hoje ela ainda arrecada materiais para doar aos abrigos de animais do RS. "Quando vi que o Geraldo ia levar até o RS, comecei a fazer uma campanha no Instagram e na minha loja. Já foram três remessas que diversos mantimentos. Fiz vaquinha também para comprar roupinhas para os pets, mantas, cobertores", contou.
Adriana Batista Alfenas faz parte do Rotary Contagem das Gerais e contou como mobilizou para receber tantas doações. Ela se emocionou com a situação no Sul quando viu as notícias e começou a pensar o que poderia fazer. Logo no dia seguinte, chegou à Alfenas Imóveis, empresa onde é coordenadora de marketing, e começou a mobilização. O marido, José Antônio Alfenas, dono da empresa, também é rotariano e ajudou nas ações.
Ela focou suas doações aos animais domésticos, principalmente para cachorro e gato. “Uma amiga, Patrícia, que também é rotariana, é sócia de uma pet-shop e me ajudou a direcionar as arrecadações. Conseguimos rações, remédios para os animais (pra pessoas também), mais de 400 galões de água, roupas, brinquedos, brinquedos para os pets, seringas, cestas básicas e muito mais. Fiquei admirada porque as pessoas ajudaram mesmo. O brasileiro é solidário demais”, contou Adriana.
Apoio local
Além da região metropolitana de Belo Horizonte, as iniciativas de ajuda ao povo gaúcho contaram com o apoio essencial da sociedade na região Sul. Jamilson Martins, que é de Santa Catarina, ficou no Rio Grande do Sul por 24 dias. Ele tem um projeto chamado Vida na Estrada e já conhecia o trabalho dos Anjos do Asfalto havia muitos anos. Quando a equipe do grupo de resgate saiu de Minas Gerais para levar as doações e atuar no salvamento, Jamilson a abrigou em sua casa, e, no dia seguinte, todos pegaram estrada juntos. Na primeira viagem, a equipe foi com uma ambulância, uma caminhonete, um caminhão cheio de doações, e o catarinense foi em carro próprio.
Diante de tudo que viu, ele contou que a tragédia só não foi maior porque os moradores se mobilizaram rapidamente, usaram barcos e jet-ski para salvar outras pessoas e animais. Segundo ele, os agentes públicos, como Corpo de Bombeiros Militar e Exército, estavam despreparados e não tinham equipamento suficiente para atuar. “Os voluntários que chegaram pra ajudar muitas vezes foram barrados. Muito mais vidas poderiam ter sido salvas se existisse uma lei no Brasil voltada para prevenção e conscientização, como se fosse uma Cruz Vermelha interna”, disse ele, referindo-se à organização humanitária global que fornece assistência a pessoas necessitadas em todo o mundo.
Em vários momentos, a equipe de salvamento saiu em barcos e botes apitando pelas cidades alagadas em busca de pessoas que ainda estavam ilhadas. Também acompanharam as equipes da Polícia Civil, que fizeram a segurança dos espaços. Cachorros e gatos foram retirados de telhados, muitas vezes de locais escondidos e de difícil acesso.
Jamilson contou que foi nítido ver que o povo brasileiro é muito generoso. “Tenho um colega do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) que perdeu tudo, ficou só com o macacão de trabalho. As pessoas ainda vão precisar muito de cobertores. O inverno gaúcho vem aí e é bem frio, inclusive para bebês e recém-nascidos. Foram enviadas muitas cestas básicas, colchão, água, muita roupa, toneladas de produtos de limpeza, produtos veterinários, fraldas descartáveis, luvas e muito mais”, afirmou o voluntário, que era motorista de ônibus rodoviário e está aposentado.
Lesly Monrat atua em um projeto chamado Trilhas da Criança, em Florianópolis, que proporciona experiências na natureza às famílias. Quando soube da tragédia no Rio Grande do Sul, iniciou logo uma ação para arrecadar doações. Como já conhecia Geraldo Eugênio pelas redes sociais, articulou com ele para fazer as entregas. “Aproveitamos nossa comunidade e pedimos para trazerem doações em uma das nossas ações, nosso cineclube ambiental. Nesse dia, conseguimos muitas doações que anunciamos desde o início que iriam para os Anjos do Asfalto. Eles vieram buscar as doações e conseguiram lotar o caminhão juntando com que vinham de Minas”, contou Lesly.
Aconchego
Além das doações que alimentam e aquecem o corpo, também têm aquelas que enchem os corações. As carretas que saíram de Minas Gerais conduzidas por Geraldo Eugênio e voluntários dos Anjos do Asfalto levaram cartinhas para as crianças e chocolates e o resgate da cultura sulista.
A Prevenir Proteção Veicular, que realizou a doação de cestas básicas, também patrocinou a compra de 200 quilos de erva-mate, que contou com a ajuda de Lesly para montar os kits. Ela e sua equipe cuidaram desse mimo e fizeram com que chegasse um carinho cultural para os moradores do Sul. Essa planta nativa da América do Sul é utilizada para preparar diversas bebidas, entre elas o chimarrão, tradicional da região e um dos principais símbolos culturais do Rio Grande do Sul.
Lesly também conduziu uma das ações voltadas para o público infantil. Ela mobilizou as crianças participantes para escreverem cartas e para fazerem doações de chocolates. Cada cartinha foi embalada em uma barra de chocolate e entregue a meninas e meninos que estavam em abrigos de Canoas e outros municípios atingidos.
Fabiana Pedrosa, empresária em Betim, fez uma grande mobilização também para contemplar as crianças do Rio Grande do Sul. “Pensei numa maneira de levar um pouco de amor para essas crianças, porque elas perderam tudo, e muitas não conseguiram resgatar nada”, contou. Ela, então, pediu ajuda de amigos e vizinhos para comprar chocolates e dos filhos para escreverem cartas aos pequenos gaúchos. Os filhos dela pediram aos amigos da escola, e a ação se multiplicou. As caixas foram levadas na carreta pelo Geraldo de Assis e pela mãe dele, dona Maria, de 82 anos, que fizeram entrega para crianças que estão em abrigos da cidade de Canoas. Ao todo, foram 460 chocolates com cartas e mais brinquedos, todos embalados um a um para presente. “Sei que não vai resolver o problema, mas, muitas vezes a gente precisa de acolhimento. Foi uma forma de levar afeto, amor”, enfatizou Fabiana.
Também em Betim, Aparecida Maria Lima Melo, que é coordenadora administrativa da coabitação Escola Municipal João Batista Machado de Brito e Escola Estadual Renato Azeredo, mobilizou as professoras para que as crianças da escola municipal pudessem escrever cartinhas para os pequenos do Rio Grande do Sul. “As crianças queriam ajudar de alguma forma, e veio a possibilidade de escreverem as cartinhas. Elas se sentiram maravilhadas em contribuir, levar palavras de esperança, força e carinho para outras crianças. Todas se sentiram importantes”, contou.
Foram 76 cartas escritas na escola por crianças entre 9 e 11 anos e foram entregues ao Geraldo, que colocou um chocolate em cada uma delas. “Vimos os vídeos, as crianças se emocionaram aqui vendo a emoção das crianças de lá. Foi muito lindo! É gratificante porque é uma forma de ajudar; os dois lados têm resultados”, disse Cidinha, como é conhecida.
Comoção nacional
e internacional
A Defesa Civil do Rio Grande do Sul divulgou um levantamento com todas as doações recebidas em meio à tragédia climática que atinge o Estado. Segundo os dados, foram doados 1,5 milhão de litros de água potável e 202,2 toneladas de alimentos diversos.
As doações foram distribuídas em 167 municípios, entre 25 de abril e 25 de maio. Segundo o balanço, foram recebidas ainda 166.076 cestas básicas, 136 mil litros de leite, 98 mil cobertores, 24 mil colchões e 244 mil kits de higiene e limpeza.
No total, a Defesa Civil contabilizou 3,375 milhões de itens recebidos e distribuídos, incluindo 62 mil sacos de ração animal,
42 mil fraldas, 364 mil kits de roupas.
De acordo com o balanço mais recente do governo gaúcho, mais de 2,3 milhões de pessoas foram afetadas de alguma maneira, enquanto 581 mil foram desalojadas de suas casas. Ainda permanecem em abrigos temporários 55.813 pessoas.
"O Rio Grande do Sul está passando por um momento de extrema dificuldade em todos os aspectos, em que famílias perderam seus entes queridos, suas casas, carros e muitos até seus sonhos. Mas o povo brasileiro de Norte a Sul tem se posicionado com grande solidariedade e disposição em ajudar e isso está fazendo toda a diferença na recuperação de tantos danos causados àquelas pessoas que perderam tudo. É nosso dever como cidadãos continuar ajudando aquele povo que tanto está sofrendo para que consiga erguer novamente", disse o presidente da Associação dos Cegonheiros de Minas Gerais (Assoceg), Jesus Gontijo.