Um norte para o frete

Política Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas foi aprovada pelo Congresso Nacional e busca proporcionar adequada retribuição ao serviço prestado

Capa / 08 de Agosto de 2018 / 0 Comentários

As tabelas terão como referência o eixo carregado, considerando as especificidades de cada tipo de carga

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Os Plenários do Senado e da Câmara dos Deputados aprovaram no dia 11 de julho a Política de Preços Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas, instituída pela Medida Provisória 832/2018. Essa matéria sofreu modificações no Congresso Nacional e foi aprovada na forma de projeto de lei de conversão (PLV 20/2018). O objetivo é promover condições razoáveis à realização de fretes no território nacional, de forma a proporcionar a adequada retribuição ao serviço prestado.

Para a execução dessa política, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) deverá publicar a tabela com os preços mínimos referentes ao quilômetro rodado na realização de fretes, por eixo carregado, consideradas as especificidades das cargas.

A carga geral é aquela embarcada e transportada com acondicionamento, com marca de identificação e contagem de unidades. A carga a granel pode ser líquida ou seca, embarcada e transportada sem acondicionamento, sem marca de identificação e sem contagem de unidades. Já a carga frigorificada é aquela que necessita ser refrigerada ou congelada para conservar as qualidades essenciais do produto transportado.

A carga perigosa é considerada passível de provocar acidentes, ocasionar ou potencializar riscos, danificar cargas ou meios de transporte e gerar perigo às pessoas que a manipulam. A última categoria é a carga neogranel, formada por conglomerados homogêneos de mercadorias, de carga geral, sem acondicionamento específico e cujo volume ou quantidade possibilita o transporte em lotes, em um único embarque.

De acordo com o texto, o processo de fixação dos pisos mínimos de frete deverá ser técnico, ter ampla publicidade e contar com a participação de representantes dos embarcadores da mercadoria, dos contratantes dos fretes, das cooperativas de transporte de cargas, dos sindicatos de empresas de transportes e de transportadores autônomos de cargas. Caberá à ANTT regulamentar essa participação. 

Diretrizes

O frete deverá ser definido, em âmbito nacional, de forma a refletir os custos operacionais totais do transporte, com prioridade para os custos do óleo diesel e dos pedágios.

A tabela de fretes será publicada duas vezes no ano (até 20 de janeiro e 20 de julho), com validade para o semestre. Se a nova tabela não for publicada nesses prazos, a anterior continuará vigente, e seus valores serão atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no período acumulado.

De qualquer maneira, sempre que o preço do óleo diesel no mercado nacional variar além de 10% do valor usado na planilha de cálculos, a ANTT deverá publicar nova tabela, considerando a variação no preço do combustível. A norma da ANTT conterá ainda a planilha de cálculos utilizada para se chegar aos fretes mínimos.

Na operação de transporte rodoviário de cargas, o motorista deverá portar o contrato de frete, com informações do contratante e do contratado, da carga, da origem e do destino, do modo de pagamento do frete e a indicação expressa de seu valor e do piso mínimo aplicável. Também determina a especificação do valor do frete que ficará com o subcontratado quando houver. 

Sanções

O projeto sobre o frete rodoviário concede à tabela de frete mínimo uma natureza obrigatória nas relações de contratos de transporte, sujeitando aquele que não a seguir a indenizar o transportador em valor equivalente ao dobro do que seria devido, descontado o pago, sem prejuízo de multa a ser aplicada pela agência.

Uma emenda apresentada pelo relator e aprovada pelo Congresso concede anistia dessa indenização aos infratores da regra entre os dias 30 de maio de 2018 e 19 de julho de 2018. Assim, somente a partir de 20 de julho deste ano é que a indenização passará a ser devida por aquele que não seguir a tabela do frete mínimo.

Pisos mínimos diferenciados poderão ser estabelecidos para o transporte de contêineres e de veículos de frotas específicas, dedicados (quando não há compartilhamento do espaço do caminhão por cargas de diferentes proprietários) ou fidelizados por razões sanitárias ou por outras consideradas pertinentes pela ANTT.

O texto prevê ainda a responsabilidade subsidiária pelo pagamento da indenização pelo frete contratado abaixo do preço mínimo a quem anunciar ofertas de frete em valores inferiores.

Ajustes

A matéria foi aprovada na forma do projeto de lei de conversão do deputado Osmar Terra (MDB/RS) – visto que a MP 832 foi alterada por emendas. Entre elas está a proibição de celebrar qualquer acordo ou convenção, individual ou coletivamente, no sentido de praticar fretes em valores inferiores aos pisos mínimos.

O relatório de Osmar Terra também concede anistia aos caminhoneiros e às empresas transportadoras em relação às multas e às sanções previstas no Código Brasileiro de Trânsito (Lei 9.503/97) e em outras normas ou decisões judiciais e relacionadas à greve da categoria de 21 de maio a 4 de junho deste ano. Há, entretanto, um compromisso do governo com alguns partidos contrários à medida no sentido de vetá-la para uma discussão posterior sobre o assunto.

Outra mudança com relação ao texto aprovado em comissão mista é a retirada de artigo que responsabiliza subsidiariamente plataformas que veiculem anúncios de ofertas de frete abaixo do preço mínimo tabelado pela ANTT.

“Desde 2001, participo da busca pela implementação de um instrumento para oferecer parâmetro ao frete. A política proposta está de acordo com o que defendemos”, pontua Carlos Alberto Litti Dahmer, presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de Ijuí-RS (Sinditac Ijuí). Segundo ele, o próximo passo é a sanção presidencial. 

Demanda de longa data

A política de piso mínimo na prestação de serviço no transporte rodoviário de cargas foi uma das reivindicações dos caminhoneiros que paralisaram suas atividades recentemente. Em 27 de maio, essa política foi instituída por meio da MP 832, sob a responsabilidade da Comissão Mista, formada por 26 senadores (13 titulares e 13 suplentes) e também 26 deputados federais (13 titulares e 13 suplentes).

Contudo, Plínio Nestor Dias, atualmente licenciado da Presidência do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de São José dos Pinhais-RS (Sinditac SJP), enfatiza que é um pleito de quase 20 anos. Em 1999, surgiu a necessidade de tabelamento. Nos anos seguintes, essa demanda continuou, mas a criação de um parâmetro não avançou.

Em 2015, caminhoneiros paralisaram suas atividades por cerca de duas semanas. Estradas em todos os Estados do país foram bloqueadas pelos caminhoneiros com o objetivo de solicitar a redução no preço do diesel e do pedágio, além do tabelamento dos fretes e de mudanças na legislação que flexibilizem a jornada de trabalho. A categoria também defendeu a liberação de mais horas trabalhadas por dia para aumentar os ganhos dos profissionais.

Em março desse ano, a presidente Dilma Rousseff sancionou, sem vetos, a Lei dos Caminhoneiros (13.303/2015) como resposta ao movimento grevista. A lei assegurou o perdão das multas por excesso de peso expedidas nos últimos dois anos, a isenção de pagamento de pedágio para eixo suspenso de caminhões vazios e a ampliação de pontos de parada para descanso e repouso. A flexibilização das horas de trabalho, outra demanda do grupo grevista, também foi atendida.

Reunião da Comissão Mista que aprovou a medida provisória

“É um sonho da categoria. A atual política vai resolver 80% das questões para a prestação do serviço e aquecer a atividade econômica das cidades. Importante frisar que não é o tabelamento e, sim, um instrumento para orientar o frete”, explica Dias.

Irani Gomes, presidente do Sindicato dos Transportadores de Combustível e Derivados de Petróleo de Minas Gerais (Sindtanque), corrobora a importância de o setor ter um balizador para a cobrança do frete e pontua que a atual política reflete, com certeza, os anseios da categoria: “Atualmente, há um leilão de frete no mercado, que não consegue absorver os reais custos para a execução do serviço. Ao se implementar a política de piso mínimo, a atividade de transporte avançará ainda mais, tenho certeza”. 

Somando força

Os entrevistados desta reportagem enfatizam a relevância da paralisação dos caminhoneiros para mostrar a força do segmento e os sérios problemas estruturais enfrentados pelos profissionais do transporte. “Foi um movimento dos caminhoneiros, e a sociedade percebeu sua importância para o país. Todos nós somos responsáveis pela promoção do desenvolvimento da nação, e a política de piso mínimo oferece um parâmetro para não se sacrificar ainda mais a atividade”, ressalta Norival de Almeida Silva, presidente do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado de São Paulo (Sindicam-SP) e da Federação dos Caminhoneiros Autônomos de São Paulo (Fetrabens-SP).

Ele conta que a federação ajudou no levantamento de informações para contribuir com a construção da política e que o desafio agora é implementa-la. “Por meio desse instrumento, haverá o controle dos custos, e eliminaremos os atravessadores, que comprometem ainda mais o setor”, afirma. Silva completa que, após a aprovação da política, é preciso ter sensibilidade para realizar alguns ajustes para a real aplicação dela.

No que tange à fiscalização da implementação da política, ainda não há diretrizes. Contudo, um caminho poderá ser através do Conhecimento de Transporte Eletrônico (CTE). 

Defasagem

Segundo o último levantamento da NTC&Logística, a defasagem ao longo do ano passado no preço foi de 20,60% nos fretes de carga-lotação e de 13,95% para carga fracionada. De acordo com a pesquisa, 62% das empresas entrevistadas tiveram queda no faturamento, e 47,6% diminuíram de tamanho.

O setor de transporte rodoviário de carga foi fortemente atingido pela situação econômica do Brasil dos últimos quatro anos, e o pagamento do frete ficou prejudicado. Segundo o levantamento, 52,4% das transportadoras estão com fretes a receber em atraso, o que significa, em média, que as empresas demoram 25,9 dias para serem pagas. Como consequência disso, 40,6% delas estão com parte da frota parada, e 29,3% sofrem com alguma ação trabalhista.


“Atualmente, há um leilão de frete no mercado, que não consegue absorver os reais custos para a execução do serviço. Ao se implementara política de piso mínimo, a atividade de transporte avançará ainda mais, tenho certeza.”
Irani Gomes, presidente do Sindtanque-MG


Os fatores que mais contribuíram para essa situação em 2017 foram, nesta ordem, o aumento dos custos, em especial o do combustível (9,44% nos postos e 12,49% nas distribuidoras), das despesas administrativas (3,55%), de manutenção (1,94%), dos pneus novos (7,56%) e dos veículos (8,60%), bem como as majorações de salários, que chegaram a 4,50%.

Uma das principais recomendações é fazer as contas e adaptar a remuneração aos desafios que estão por vir, além de encontrar o equilíbrio comercial necessário junto aos contratantes.

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