Vontade política pouparia mortes na 381
Especialista em mobilidade urbana critica inércia na implementação do novo projeto da rodovia; mobilização chamará atenção para a importância do tema
A- A A+São 15 anos de atuação com o objetivo de oferecer uma solução para o trajeto ultrapassado e extremamente perigoso da BR-381 na região Leste de Minas Gerais. Muito estudo, reuniões com atores estratégicos, divulgação do tema na mídia e mobilizações são as frentes de trabalho do consultor em assuntos urbanos, trânsito e transporte José Aparecido Ribeiro.
Membro da Comissão Técnica de Transporte da Sociedade Mineira dos Engenheiros (SME), diretor da Associação Comercial e Empresarial de Minas (ACMinas) e presidente e fundador da Organização Não Governamental SOS Rodovias Federais e da SOS Mobilidade Urbana, José Aparecido Ribeiro, ressalta que os números de acidentes da 381 são “de guerra”. Segundo ele, estatísticas divulgadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) revelam uma média de 170 mortes por ano no local. “Porém, dados da instituição Anjos do Asfalto mostram que 40% dos acidentados graves morrem a caminho do hospital, dentro das unidades de resgate, ou alguns dias depois, não constando em nenhuma estatística”, pontua Ribeiro.
Acompanhe sua entrevista exclusiva à Entrevias.
EV: Quais são os problemas enfrentados nas obras da BR-381 Norte, especialmente no trecho de João Monlevade?
José Aparecido Ribeiro: Falta de compromisso do Ministério dos Transportes na liberação dos recursos dos trechos já licitados e, sobretudo, desconhecimento das autoridades de Brasília sobre a gravidade do tema e sua urgência. A obra da 381 não pode seguir os trâmites da burocracia brasileira. Trata-se de uma obra de segurança nacional. O número estarrecedor de mortes e de acidentes que acontecem ali em virtude do traçado ultrapassado e do fato de ser uma rodovia de pista simples, que facilita a ocorrência de colisões frontais, deveria merecer atenção especial do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e do Ministério dos Transportes.
Essa obra tem esbarrado na questão do meio ambiente e na morosidade de quem dirige esses órgãos. Inadmissível que ela fique parada porque os “xiitas” do meio ambiente descobrem no caminho uma árvore, por exemplo, que pertence à Mata Atlântica e não pode ser removida. Ela é importante sim, mas vidas humanas são muito mais. Corta-se essa árvore, e plantam-se mil se necessário for. Vidas humanas não podem ser substituídas. Beira a irresponsabilidade o que os órgãos de meio ambiente de Minas Gerais estão fazendo em relação à 381.
Há disputas políticas nesse tema. Inaceitável e abominável tal postura. Sinto também certo desprezo do governo de Minas com o assunto. A obra não está parada por falta de dinheiro, mas por falta de vontade dos agentes públicos envolvidos, com exceção da juíza federal de Ipatinga, Deise Staling, que tem agido proativamente para garantir que pelo menos o lote 7 continue andando.
EV: Uma das justificativas para o atraso das obras é a possibilidade de interrupção total do tráfego na rodovia, o que causaria uma série de impactos negativos aos moradores e a quem trafega pelo local diariamente. Essa informação procede?
JAR: Não procede. É possível fazer a obra no sistema Pare e Siga, embora o correto fosse um novo traçado menos sinuoso e até mais recomendável pela engenharia. Mas isso é passado, e não devemos perder tempo. Temos de olhar para o que é possível e, mesmo assim, não está sendo feito. O que não pode é a obra ficar parada por causa da burocracia e da falta de compromisso do governo.
A população está disposta a sacrifícios para ver a 381 duplicada. Desculpas não são mais admissíveis. Dos 12 lotes, apenas um está se arrastando a passos de tartaruga: o lote 7, que vai do trevo de Caeté até o de Barão de Cocais, com 37 km. Se pelo menos esse andasse, naturalmente, os outros andariam também. Os lotes 8 A e 8 B nem foram licitados novamente e são, sem sombra de dúvida, os mais importantes, pois ligam a avenida Cristiano Machado (em Belo Horizonte) até o trevo de Caeté. Esse é o palco dos maiores acidentes e precisa ser duplicado urgentemente.
O sistema de RDC (Regime Diferenciado de Contratação) permite a apresentação de uma proposta mínima compatível com o trecho. Porém, o Dnit orçou a obra abaixo do custo real, com referências da engenharia que não existem mais. Um detalhe inadmissível, que coloca em xeque a capacidade técnica do órgão. O departamento possui engenheiros qualificados, e eles precisam trabalhar sem interferências políticas. O apadrinhamento, infelizmente, continua sendo uma prática no Dnit, e isso prejudica o desenvolvimento da obra.
EV: Há um empura-empura entre o Dnit e o consórcio formado pelas empresas Isolux/Corsan/Engevix, responsáveis pelo trecho? Como o poder público estadual está se comportando diante dessa situação?
JAR: Absurdo o que a Isolux fez. Jogou o preço no chão, sabendo que não daria conta de honrar. Isso mostra que o RDC, embora seja o melhor regime de contratação, precisa ter mecanismos que garantam a execução da obra. Por outro lado, o Dnit deve parar de perder tempo e fazer uma licitação realista, que evite desperdícios e que também garanta a qualidade da obra. O menor preço nem sempre significa a melhor alternativa.
A obra não é simples. Possui viadutos, pontes, túneis e aterramentos. Nenhum empreiteiro, exceto a Isolux – e não é por acaso que quebrou –, vai correr o risco de oferecer um orçamento que não lhe permita realizar a obra.
O consórcio Brasil, atualmente responsável pelo lote 7, foi o que apresentou uma proposta com os preços mais baixos. Mesmo assim, não conseguiu chegar aos valores que o Dnit colocou como referência.
EV: Existe o planejamento de alguma ação que visa mobilizar a sociedade em torno da realização das obras? Se sim, como será o movimento e qual o seu objetivo?
JAR: Estamos conversando com lideranças nas cidades afetadas pela paralisação da obra, e, possivelmente, o Movimento SOS BR 381 deve convocar uma manifestação para os próximos dias. Não podemos ficar passivos diante do descaso com a vida. A bancada federal de Minas em Brasília não está compreendendo a gravidade do problema e tem se revelado desmobilizada. O assunto deveria ser prioridade do governo de Minas e de toda a bancada federal na capital do Brasil.
EV: Quais são os caminhos para, de fato, se resolver a mobilidade da BR-381?
JAR: O governo precisa honrar seus compromissos. Se contratou pelo RDC, que é o sistema mais rápido e eficaz, precisa honrar. E isso não está acontecendo. No modelo 8.666 (lei de licitações, criada em 1993), a contratação fica mais morosa, havendo o risco de a obra não sair.
EV: Gostaria de deixar uma mensagem para os leitores da Entrevias?
JAR: Parabenizar a equipe da revista, que tem dado espaço para esse tema, um dos mais importantes para o Estado de Minas Gerais, embora nossas autoridades não demonstrem interesse. Sempre ouvi dizer que a obra de duplicação da 381 não saía do papel porque o governo estadual era do PSDB e o governo federal estava nas mãos do PT. Agora, não há desculpas. A gestão estadual, além de ser do mesmo partido do federal, tem relações próximas com seus componentes.
Sinto que o governo de Minas está perdendo a oportunidade de dar uma resposta para a população que o elegeu em relação aos assuntos 381, Anel Rodoviário e Rodoanel. São obras inadiáveis, que, para serem realizadas, precisam da pressão do governador. Até onde se sabe, ele não tem feito essa pressão. Diante disso, a população vai para a rodovia, e as manifestações irão retornar em breve, todos os dias 13 de cada mês, como aconteceu em 2012.
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